O cachacista (sommelier de cachaça) Jairo Martins fala sobre a elaboração do produto
tipicamente brasileiro, tipos e qualidades de uma bebida.
Toda bebida existe para dar prazer, mas quem a bebe só vai aproveitar suas verdadeiras qualidades depois de submetê-la à análise sensorial, ou, em outras palavras, depois de degustar. A degustação constitui a mais poderosa ferramenta, o caminho mais legítimo e confiável para você conhecer a personalidade da cachaça, construir sabedoria e crítica sobre a bebida. Degustar não é o mesmo que beber ou mesmo bebericar, que significa beber em pequenos goles. Degustar é provar, beber delicada e cuidadosamente, prestando atenção às características sensoriais importantes: aparência, cor, aroma e sabor.
tipicamente brasileiro, tipos e qualidades de uma bebida.
Toda bebida existe para dar prazer, mas quem a bebe só vai aproveitar suas verdadeiras qualidades depois de submetê-la à análise sensorial, ou, em outras palavras, depois de degustar. A degustação constitui a mais poderosa ferramenta, o caminho mais legítimo e confiável para você conhecer a personalidade da cachaça, construir sabedoria e crítica sobre a bebida. Degustar não é o mesmo que beber ou mesmo bebericar, que significa beber em pequenos goles. Degustar é provar, beber delicada e cuidadosamente, prestando atenção às características sensoriais importantes: aparência, cor, aroma e sabor.
A degustação da cachaça pode ser feita de forma científica, sendo neste caso conduzida por especialistas denominados cachacistas ou cachaçólogos (degustadores profissionais), que anotam em formulários específicos os vários aspectos técnicos da bebida. Pode-se degustar de forma “hedonística” ou mais simplificada. O objetivo principal aqui é a apreciação, procurando sentir prazer em cada gole, sem grandes preocupações analíticas.
Esta seção está voltada para o degustador amador. Sem a preocupação em se esgotar o tema, o objetivo principal é passar as orientações básicas, numa linguagem simples e acessível, sobre cuidados e dicas importantes para se apreciar as melhores cachaças do Brasil.
Dicas para degustação
“Beber cachaça com elegância é arte de não se fazer notar, aliada ao cuidado sutil de se deixar distinguir”. Jairo Martins da Silva
Como qualquer outra bebida, alcóolica ou não, a cachaça aproxima pessoas e faz amigos. Assim, não se pode negar o poder social dessa bebida genuinamente brasileira, que estabelece ligações, facilita a comunicação e o diálogo entre as pessoas. Beber cachaça entre amigos, desfrutando os prazeres de uma boa conversa é também uma questão de harmonização, devendo-se sempre seguir a importantíssima regra de ouro: “Beba pelo prazer, privilegiando a qualidade e nunca a quantidade”.
O LOCAL
A degustação, ou simplesmente a apreciação, deve ser feita, em local limpo, arejado, com boa iluminação, em copos ou taças próprios de vidro branco e transparente, um para cada tipo. Cinco tipos de cachaça em cada degustação é o máximo que se recomenda. A formação de um círculo de interessados, que se reúnam habitualmente, por prazer e não por obrigação, para apreciar cachaças de tipos e origens variadas, pode ser interessante.
Com o copo ou taça preenchido com, no máximo, um terço da sua capacidade, a degustação é normalmente feita em três fases: visual, olfativa e gustativa.
O EXAME VISUAL
Em primeiro lugar, é sempre importante ler o rótulo que deve conter as principais informações como teor alcóolico, o nome do fabricante, o registro do produto no Ministério da Agricultura e, se for uma cachaça envelhecida, o tempo e a madeira do envelhecimento.
Antes de tomar o destilado, é preciso examiná-lo. A cachaça pode ser branca, amarelo claro, o que indica que a bebida foi envelhecida em um barril de madeira. Há ainda as que têm um tom amarelo mais escuro ou dourado, provavelmente pelo uso de melado ou caramelo para a alteração do sabor. Embora o uso de caramelo seja um processo artificial de coloração, a legislação brasileira permite essa prática.
A presença de ciscos - substâncias decantadas no fundo da garrafa - é mau sinal.
A formação de espuma na parte de cima, quando sacudida vigorosamente, é também um bom método para avaliar a cachaça ainda dentro da garrafa. Essa espuma deverá se desfazer com uma certa rapidez, dando lugar a um "rosário" de contas graúdas, que desaparece em pouco mais de 10 segundos. No restante da bebida também formar-se-ão pequenas bolhas, em grande quantidade, desaparecendo nesse mesmo tempo, indicando boa graduação alcoólica e boa destilação.
O copo ou a taça deverá ser de tamanho pequeno, preferencialmente de vidro ou cristal, para conservação dos elementos aromáticos, percepção das condições de limpeza e transparência da cachaça.
Para completar o exame visual, o copo deve ser rodado/agitado para que o líquido molhe suas paredes internas. O movimento descendente da bebida formará arcos e pernas, também chamados de “choro” ou “lágrimas da cachaça”. Nas cachaças de qualidade, essas ondulações permanecem na parede do copo por um tempo maior. Na prática, diz-se que “toda a cachaça tem que chorar e que, se ela não chora, vai chorar depois quem a bebe”.
O EXAME OLFATIVO
A segunda fase do ciclo da degustação da cachaça é o exame olfativo. Ao cheirar a cachaça, o degustador descobrirá os aromas que a caracterizam, que, em princípio, são três: o primário, próprio de toda a cachaça, que é o da cana-de-açúcar. O aroma secundário é adquirido durante a fermentação, produzido pelas substâncias secundárias, principalmente ésteres, aldeídos e óleos. O aroma terciário é transmitido pela madeira do recipiente onde a cachaça foi armazenada.
Os principais aromas a serem reconhecidos são: o alcoólico, o frutado, o ácido, o adocicado e o estranho.
Para se fazer o exame olfativo completo, é importante seguir três estágios. No primeiro, aproxima-se o nariz da borda do copo em repouso para se sentir a intensidade e a fineza da cachaça. No segundo estágio, faz-se um ligeiro movimento circular com o copo para que aromas mais sutis, ainda não percebidos, sejam liberados. As cachaças de qualidade apresentam o aroma frutado, que identifica a presença de ésteres. O aroma alcoólico deve existir, mas não deve ser acentuado. O aroma ácido (azedo) deve ser discreto – quando acentuado indica qualidade inferior. Já o aroma adocicado, do mesmo modo, não deve se destacar.
Ou seja, todos esses aromas devem existir na cachaça, só que em quantidades bem diferentes. Por último, o aroma deve ser agradável, não podendo arder nem o nariz e nem os olhos.
O terceiro estágio é o da consolidação das impressões olfativas, para o qual deve-se agitar vigorosamente o copo, para que apareçam os aromas mais marcantes.
Agluns cachaçólogos recomendam que se esfregue um pouco de cachaça na mão e sinta o odor. Se a cachaça for de qualidade, o primeiro cheiro lembrará a cana, se não for de qualidade lembrará álcool. Logo em seguida, balance as mãos e esfregue novamente, o segundo cheiro lembrará a madeira, quando a cachaça for de qualidade, caso contrário terá odor insalubre.
O EXAME GUSTATIVO
A terceira fase do ciclo é o exame gustativo. Ao se colocar a cachaça na boca, tem-se a prova final. Através das papilas gustativas, localizadas na língua, podemos perceber os quatro tipos de sabores: doce, salgado, amargo e ácido.
Nesse exame, também as seguintes características são analisadas: estrutura, acidez, álcool e corpo. A estrutura retrata sua adstringência. Isto é, uma boa cachaça é aveludada, não transmitindo travo ou amargor, aquela sensação de “amarrar a boca”. A acidez é a mesma sensação que encontramos em frutas cítricas, como o limão.
A cachaça deve ser macia e redonda, ou seja, não deve ser picante nem arranhar na garganta. Devido a seu alto teor alcóolico, é preciso ter muito cuidado em avaliar o gosto da bebida, pois o álcool pode amortecer as papilas gustativas e, com isso, mascarar os demais sabores.
Em microgoles, pode-se analisar a presença do álcool na cachaça, como uma sensação queimante até suave. A cachaça não pode queimar profundamente mas sim de uma forma agradável.
A cachaça deve ficar por alguns segundos na boca. Uma boa cachaça apresenta quatro sabores - adocicado, ácido, amargo e salgado - mais ou menos acentuados, dependendo da marca.
Se você for degustar mais de uma cachaça, não esqueça de beber um pouco de água mineral, sem cloro e gás, isto é, lavar a boca, entre uma e outra cachaça. Sua boca deve estar limpa, sem resquícios da cachaça anterior.
Lembre-se que degustar não é o mesmo que beber. A dose do degustador é menor do que a dose aperitiva que precede a refeição ou aquela que acompanha o papo. A dose ideal tem a altura equivalente à largura do dedo indicador da mão do degustador.
Uma taça de cristal, criada especialmente para degustar uma cachaça de qualidade, é o mais recente requinte desenvolvido pelos produtores. O desenho, a criação e a produção do cálice oficial da cachaça é resultado do esforço da Fenaca (Federação Nacional das Associações dos Produtores de Cachaça de Alambique) e da Coocachaça (Cooperativa de Produção e Promoção da Cachaça de Minas). As duas entidades lutam pela qualificação da bebida, pela certificação mundial de origem controlada e pelo aumento da exportação do produto. A taça de cristal atende às exigências do consumidor brasileiro jovem e sofisticado, que, cada vez mais, adota a cachaça fina em substituição aos destilados importados.
“O antigo copo de cachaça não combinava com o novo perfil de bebida requintada que a cachaça assumiu. Trabalhamos no desenvolvimento desta taça de cristal há cinco anos”, afirma uma das patrocinadoras do projeto, a empresária e membro do conselho da Coocachaça, Dirlene Maria Pinto. “A nova taça possui a sofisticação que a cachaça de qualidade merece. Seu formato foi estudado para favorecer a degustação”, acrescenta Dirlene.
O cálice
Tem 13 cm de altura, uma base arredondada e é mais fechado na borda. A haste alongada não deixa o calor da mão interferir no sabor da bebida. O ligeiro estrangulamento da borda da nova taça ajuda a concentração do feixe dos aromas característicos da bebida. Em um copo comum, quando a borda é mais espessa e reta, o aroma tende a se espalhar e o bouquet se perde. A nova taça também permite a observação da cor, oleosidade, limpidez, brilho e a formação das lágrimas da bebida – em uma boa cachaça, grandes gotas devem ser constantes e homogêneas e escorrer lentamente pela superfície interna e translúcida.
Especialistas garantem que o formato, o material e o design do copo interferem na percepção das características visual, olfativa e gustativa da bebida. A explicação está relacionada à maneira como o líquido chega às zonas de paladar. A ponta da língua é sensível ao doce; a parte de trás, ao amargo; e as laterais, aos sabores salgado e ácido.
A taça oficial de cachaça será produzida em cristal pela empresa Cristais Hering, de Blumenau, Santa Catarina. A empresa aperfeiçoou um protótipo feito artesanalmente por uma cristaleria de Portugal em 1998 e redesenhado pelo engenheiro René Vogt. O lançamento oficial da taça de cachaça terá uma programação especial em vários estados brasileiros. Em São Paulo, a taça teve seu lançamento em outubro de 2003.
Para saber mais não deixe de dar uma olhada no livro: Cachaça, O Mais Brasileiro dos Prazeres.
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